Pra mim, o ano velho terminou com uma linda lição. De repente, surge uma garotinha à porta da Secretaria de Assistência Social. “Eu posso falar com o Auro Maia?” pergunta. Rapidamente, ela é convidada a entrar e, com desenvoltura, expõe os motivos de sua visita. “Olha o assunto é muito sério. Sério mesmo! Minha tia tem grave problema de visão. É miopia sabe...”
Em poucos instantes, a menina de apenas 11 anos de idade relatou a história da tia e a luta para conseguir o encaminhamento através do serviço público. “Olha, faz um ano que ela está tentando e não consegue e agora disseram que não vai ter jeito. Quando minha tia me falou sobre o problema eu prometi que iria ajudá-la e que isso não iria ficar assim”.
No decorrer de sua fala, ela faz uma revelação: “Sabe, eu tenho um grande sonho, estudar numa escola particular”. “Bom, mas o senhor vai ajudar a resolver o problema da minha tia?”. Respondi que a assistente social iria fazer uma visita e os encaminhamentos possíveis para atendê-la. “Mas quando é que o senhor vai me dar uma resposta”. “Hoje mesmo visitaremos sua tia, qual é o telefone da sua casa?”. E ela me passou o número de um celular: “É meu celular, é feinho, mas é meu”. “Bom então eu vou ficar aguardando um retorno seu”. E saiu sozinha, caminhando como uma pessoa que tem uma clara visão de cidadania.
Juliana e eu ficamos impressionados com a capacidade de argumentação e o conhecimento daquela criança. É raro ver até num adulto tamanha clareza, firmeza e convicção. Na correria da vida, nós adultos tantas vezes deixamos de acreditar em nós mesmos, nos nossos sonhos e somos tentados a desistir. Ainda mais no cansaço do final de ano. E a garotinha veio trazer o recado: “Não importa o tamanho do problema é preciso fazer de tudo para resolvê-lo”.
2011 bate a nossa porta como uma criança ansiosa por tornar melhor a vida de todos. Cabe a nós receber o Ano Novo sem temor, sem receio de lutar e ir, seja aonde for, para alcançar esse objetivo. Nós cidadãos, independente da posição que ocupamos na sociedade, precisamos procurar os meios necessários para que possamos solidária e coletivamente viver melhor, conscientes de que, se cada um fizer a sua parte, muito será possível. Nós, representantes do Poder Publico temos por obrigação ouvir, avaliar, correr atrás para resolver. Afinal de contas, é para servir que estamos no poder.
O cansaço do ano que termina faz parte do passado, algumas pendências, dificuldades previstas, tudo parece ameno, novas possibilidades surgem e o mais importante é que é preciso continuar, realizar nossos sonhos, porque a qualquer hora uma criança vai bater à nossa porta: “Posso falar com o senhor? O assunto é muito sério...”
Seu nome? Tainara. Por curiosidade busquei o significado: “De origem indígena, variante de Taiguara. O Liberto. Muita compaixão e amor pra dar, é capaz de passar a vida fazendo o bem pelas pessoas, chega até a se esquecer que também é uma pessoa que pode precisar de receber ajuda e amor”. Imagine se todo mundo pudesse ser Tainaras e Taiguaras.
Lembrei-me das músicas do Taiguara, cantor e compositor, símbolo da resistência à censura durante a ditadura militar. “Lá onde eu estive o sonho acabou, cá onde eu te encontro só começou. Lá colhi uma estrela pra te trazer, bebe o brilho dela até entender que eu preciso, eu preciso de você. Nós precisamos sim, você de mim, eu de você”. Teu sonho não acabou, linda música, bom pra começar 2011. Por que o sonho das crianças não pode acabar!
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