quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

A pessoa que passa e zomba


Tenho pena, quando vejo uma pessoa deitada na sarjeta alcoolizada ou drogada e alguém passa e zomba dizendo que é um vagabundo, Tenho pena daquele que passa e zomba. Na sua ignorância a pessoa que aponta o dedo e acusa, desconhece que o outro, na sarjeta, é uma vítima da droga, do álcool e a ajuda que precisa não é esmola, nem piedade, ele precisa muito de oportunidade.
        
A pessoa que passa e zomba desconhece que o usuário de drogas tem transtornos mentais que o levaram a estar numa situação de rua e que, nessa situação, a oportunidade que ele mais precisa é o tratamento.  
    
A pessoa que passa e zomba também finge desconhecer que o álcool, vendido em tantos botecos e casas na cidade, é a porta de entrada para as outras drogas. Digo que finge desconhecer porque é impossível que alguém ainda não saiba disso. Finge desconhecer porque ainda pensa que essa é uma hipótese absurda, pois muita gente bebe socialmente e não cai nas ruas, nem mora nas praças.
    
A pessoa que passa e zomba desconhece que o crack é uma droga tão devastadora que vicia logo na primeira vez. O cérebro da pessoa que usa álcool e crack sofre danos irreparáveis, a saúde fica debilitada e a vida se transforma em momentos intermináveis de dor e sofrimento. Outro dia, atendi um pai que queria matar os seus dois filhos porque não agüentava mais os transtornos que eles causavam. Mentiam, roubavam e vendiam todos os objetos e utensílios da própria casa por uma pedra de crack. Nenhum pai ou mãe por mais amor que tenha nos seus filhos consegue resolver sozinhos um problema desses. Assim, muitas pessoas saem de casa e vão morar nas ruas, porque a convivência se torna impossível. E muita gente simplesmente passa e zomba.   
    
Pessoas jogadas nas ruas são espelhos de uma sociedade individualista que ainda privilegia o lucro acima da vida, cujos valores se limitam às aparências, ao ter acima do ser Mas não escrevo este artigo para recriminar ninguém e só pra ficar apontando mais culpados pela situação. Escrevo para convocar a sociedade e o poder publico para agir e mudar essa realidade.
    
Gosto muito daquela comparação que diz que o traficante é o peixe e os usuários de droga são a água. Se tiramos a água, o peixe morre. O que nós estamos fazendo para diminuir o número de usuários de droga? Dar esmola para comprar a pinga, por dó ou piedade, é o pior caminho. Quem ganha com isso é apenas o dono do alambique ou do bar. Outro dia, recebi uma reclamação sobre moradores de rua num determinado espaço da cidade. No local, há um bar que vende pinga para os moradores de rua. E fiquei pensando até quando vou ter que ouvir esse tipo de reclamação. E aqui me atrevo a dizer que é preciso rigor na fiscalização dos bares espalhados pela cidade, saber qual é a origem da cachaça que é vendida nas casas. É preciso que alguém, que não se importe com o desgaste político, elabore uma lei que proíba a venda de bebidas alcoólicas em postos de gasolina. Se o álcool é a porta de entrada para as outras drogas é preciso fazer muita coisa para diminuir o consumo de álcool.
    
É preciso ajudar na estruturação das clinicas de tratamento para dependentes químicos. É preciso implantar os serviços de assistência social, saúde e educação, que permitem o tratamento e recuperação. A implantação dos Centro de Apoio Psicossocial para alcoólicos e drogaditos e do Serviço de Atendimento à População de Rua numa parceria entre os setores da saúde e assistência social, a experiência da Casa Solidária, que abriga pessoas em situação de rua, são ações que trazem bons resultados. 
    
Sei que juntos, sociedade e poder publico podem fazer muito. Basta que o preconceito dê lugar à solidariedade.

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